domingo, 26 de abril de 2009

Parabéns Batman

A primeira história do Homem-Morcego foi lida numa revista chamada "Detective Comic Magazine", nos Estados Unidos, a 18 de maio de 1939, numa época considerada "A Era de Ouro dos Quadrinhos", em que foram criados muitos heróis brilhantes e até imortais, como Flash Gordon, Mandrake, e tantos outros, e um desses "tantos outros" era o Super-Homem.
Nessa época, havia uma emoção incrível pelos heróis dos quadrinhos, que brilhavam em tiras publicadas nas páginas de jornais - e também, em revistinhas autônomas, que eram lidas por crianças e adultos. As crianças adoravam e se divertiam com os heróis de papel - e viviam brincando de heróis de gibi. Os adultos viam nesses heróis uma boa maneira de esquecer um pouco a dureza do mundo e da vida.
Parabéns Batman por ter evoluído com seus fãs, por ter divertido a geração dos anos 30 e 40, por ter dado a volta ao mundo e encantado as culturas diversas, por ter feito a diferença em todo o contexto histórico nacional e mundial, por ter enfrentado as diversas crises econômicas, guerras, por fim parabéns por ter completado 70 anos de história no dia 18 de abril e também por fazer parte da história, fazendo a diferença na arte pop, nos quadrinhos, no cinema e na cultura.

sábado, 25 de abril de 2009

Cinema, Mitologia e Literatura Grega


Ao longo de mais de 2.500 anos, Helena de Tróia passou por inúmeras representações, tanto no cinema como na literatura, despertando até hoje interesse em torno de sua figura. Pensando nisso a Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão (COGEAE) da PUC-SP desenvolveu o curso "Cinema, Mitologia e Literatura Grega: Helena de Tróia em Fotogramas e Fragmentos".

O objetivo é analisar, a partir de diferentes perspectivas, algumas caracterizações de Helena de Tróia em textos fundamentais da tradição ocidental - como a Ilíada e a Odisséia, de Homero, os Elogios de Helena, o de Górgias e o de Isócrates, e a Helena de Eurípides - e em filmes de renomados diretores dos cinemas europeu e americano. A partir de excertos de textos e filmes, será investigada a permanência de traços marcantes de Helena de Tróia, a fim de interpretar as alterações na construção, na passagem do texto à tela, das imagens desta mulher.

O conteúdo programático foi dividido em três tópicos. O primeiro trata de Helena de Tróia como personagem individualizada, cuja "fama do nome" vem da Grécia ao século XX; o segundo, da análise da figura de Helena como metáfora da própria mulher; e o terceiro da relação entre desejo (eros) e discórdia (eris) - neste âmbito serão examinadas, ainda, representações no romance Helena, de Machado de Assis, e em alguns poemas do século XX.

O curso tem início dia 25 de abril, com carga horária de 24 horas, divididas em seis encontros, sempre aos sábados, das 8h30 às 17h30, na Unidade COGEAE Consolação, que fica na Rua da Consolação, 881 - Consolação - São Paulo.

Mais informações e inscrições: (11) 3124-9600, www.pucsp.br/cogeae e infocogeae@pucsp.br
Fonte: História Viva

Charge de Fortuna

Publicada no Correio da Manhã em 07/10/1966

- Foi você, Maria, ou já começou a Lei de Imprensa?

Charge de Fortuna publicada no Correio da Manhã em 07/10/1966. Em plena ditadura militar, estava em discussão o projeto da nova Lei de Imprensa, que entraria em vigor no ano seguinte.

domingo, 12 de abril de 2009

O fim de uma era - Revista de História - Homenagem

Lorenzo Aldé

Ilustrar histórias em quadrinhos é para poucos. Ilustrar em quadrinhos a História, com maiúscula, nem se fale. No Brasil, este ofício era sinônimo de um único homem.

No dia 20 de dezembro de 2007, sem que o país se desse conta, morreu Ivan Wasth Rodrigues, aos 80 anos. Sobrinho e discípulo do grande pintor José Wasth Rodrigues (1881-1957), Ivan deixa como principal legado de sua vasta produção as obras-primas História do Brasil em Quadrinhos I e II (1959 e 1962) e Casa-Grande & Senzala em Quadrinhos (1981).

Cada quadrinho é uma pintura original em aquarela. E a excelência do resultado vai além da técnica. Durante mais de quatro décadas, Ivan foi um obcecado estudioso de temas históricos, para retratar o mais fielmente possível os personagens, os ambientes, a arquitetura e os costumes de todos os períodos da vida nacional.

Quem tem mais de 30 anos provavelmente retém no imaginário cenas históricas cunhadas pelo artista. Ele foi um dos ilustradores do Atlas Histórico e Geográfico Brasileiro, utilizado pelo MEC nas salas de aula nas décadas de 1960 e 70. “Ouvi mais de uma vez que o conhecimento histórico do Ivan ia bastante além do que possuíam os escritores”, lembra o artista plástico J. Bezerra, que no início da carreira cruzava o Rio de Janeiro para ir tomar lições de desenho da anatomia humana com Wasth, a quem define como “um verdadeiro sacerdote da arte, um alquimista que transcendia quando trabalhava, com esmero, cuidado, responsabilidade e amor”.

Em 2003, numa das poucas homenagens públicas que Ivan recebeu em vida, o editor Naumim Aizen atestou o mesmo: “Em determinado trecho, ele precisava colocar na ilustração a figura de Calabar, das Guerras Holandesas, de quem havia apenas fontes coevas. Pois Ivan, conscienciosamente, leu todos os documentos. E com a paciência que lhe é própria, recriou a figura de Calabar, fazendo-lhe um verdadeiro e maravilhoso retrato falado”.

Naumim era adolescente quando conheceu Ivan, na década de 1950. O pintor viera de São Paulo para morar com o tio José Wasth e com ele aprimorar sua técnica. Seu trabalho impressionou Adolfo Aizen, pai de Naumim e dono da Editora Brasil-América (Ebal), durante décadas líder na publicação de quadrinhos no país. Pela Ebal, além da História do Brasil em Quadrinhos, Ivan Wasth produziu uma versão ilustrada de O Sertanejo, de José de Alencar, que seria lançada em encarte da revista Vida Doméstica mas não chegou a ser publicada.

Naquele tempo surgiu na editora a idéia de quadrinizar o clássico Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre. Ocupado com o Atlas do MEC, Ivan não pôde assumir a missão. “Pelo menos cinco desenhistas aceitaram a incumbência e desistiram, tamanha a complexidade do trabalho”, conta Naumim. O projeto só saiu da gaveta em 1980, em comemoração aos 80 anos de Freyre. Ivan mergulhou na obra e a finalizou em seis meses, colhendo unânimes elogios pela adaptação, inclusive do próprio Gilberto Freyre.

Parte da produção de Ivan Wasth Rodrigues tem paradeiro desconhecido. “Ele não sabia cobrar, muitos o exploravam. Um dia, um padre de São Paulo esteve em nossa casa e se interessou por um conjunto de aquarelas. Ele deu de mão beijada”, lamenta Suely Jesus de Souza Surisan, viúva de Ivan. Mestre de capoeira, nos últimos quatro anos ela teve que deixar de trabalhar para cuidar da frágil saúde do marido, com quem vivia havia 25 anos. Ivan sofria do mal de Parkison e da doença de Alzheimer.

Ainda juntando os cacos do longo sofrimento e da recente perda, Suely não sabe o que fazer com as preciosidades de que se tornou guardiã. Aos poucos, começa a botar ordem no apartamento de Botafogo, o mesmo em que o velho José Wasth recebeu, há mais de meio século, seu promissor sobrinho vindo de São Paulo. Por toda parte acumulam-se pastas com aquarelas originais, muitas inéditas, dezenas de cadernos com estudos e apontamentos e uma rica biblioteca em vários idiomas. “Não tenho coragem de me desfazer das coisas dele. Pensei em doar para o Museu da República, onde ele trabalhou. Mas, entra diretor, sai diretor, não sei o que pode acontecer”, diz Suely.

Sabe-se que Ivan deixou uma obra pronta e não lançada: a adaptação ilustrada dos textos do francês André Thévet (1502-1590) sobre a França Antártica. Deixou também um desafio para a arte brasileira: produzir novos ilustradores históricos que dêem continuidade à magnífica herança dos Wasth Rodrigues.

Jango: as múltiplas faces

Rodrigo Patto Sá Motta

João Goulart, ou Jango, é um dos personagens mais controvertidos da história brasileira e, por que não dizer, dos mais trágicos também.

Presidiu um governo que mobilizou as esperanças de milhares de pessoas com a promessa de reformar o Brasil e atenuar suas mazelas sociais, mas provocando medo e insegurança em outras parcelas da sociedade, os mesmos grupos que o derrubaram do poder no fatídico 31 de março de 1964.

Dono de imagem polêmica, a suscitar tanto admiração quanto desprezo, a importância de Goulart no contexto que levaria ao golpe é inquestionável, pois suas ações e projetos, mas, sobretudo, a maneira como foram interpretados, desempenharam papel-chave no processo.

Motivados pela percepção de que a memória sobre Jango está agrilhoada aos eventos de 1964, os autores de Jango: as múltiplas faces propõem-se a lançar luz sobre outros pontos da trajetória política do ex-presidente, de modo a permitir uma visão mais ampla. Move os autores, também, o desejo de ir além das apreciações críticas sobre o político gaúcho – para eles, dominantes na literatura e na memória – e revelar as qualidades positivas do líder, que, aliás, explicam sua ascensão.

O livro não escamoteia as críticas dirigidas a Jango (aparecem referências à sua indecisão, inapetência administrativa e quebra do princípio da hierarquia militar), mas destaca seus traços positivos como lealdade (ao varguismo, em especial), talento para a negociação e sensibilidade social. É significativo o fato de que os registros sobre as qualidades de Jango tendam a se concentrar nos primeiros capítulos, dedicados à sua carreira inicial.

Na parte final do trabalho, quando entra em pauta a crise de 1964, sobressaem as análises sobre seus erros e omissões. Ele foi, de fato, político hábil, fiel ao estilo de seu mestre, mas a profundidade da crise política não seria resolvida com o que aprendera na escola varguista, que de pouco adiantou nos momentos cruciais que antecederam o golpe.

O trabalho pretende, nas palavras dos autores, ser uma espécie de biografia aberta, composta com base na seleção de depoimentos. Entre os depoentes, há desde membros do círculo familiar e pessoal a desafetos políticos e líderes do golpe, além de entrevistas que integram o acervo do CPDOC. O resultado é uma coleção de relatos e apreciações sobre Jango, organizados pelos autores de modo a cobrir os momentos principais da sua vida política. O livro ainda traz cartas e discursos do ex-presidente, alguns registros fotográficos e a reprodução sonora de um discurso, fontes a serem interpretadas pelos próprios leitores, no mesmo espírito de biografia aberta.

Os depoimentos trazem elementos novos, ou menos conhecidos, sobretudo no que tange ao período inicial da carreira de Goulart e à fase do exílio. Merecem destaque os relatos sobre o relacionamento de Goulart com os sindicalistas, no início dos anos 1950, e sua atuação como presidente do PTB. Do período pós-1964 até sua morte, em fins de 1976, ressaltam-se as referências ao sofrimento do exílio, dele e da família, que viram as amarguras do desterro associarem-se à angústia da insegurança, pois Uruguai e Argentina, países escolhidos por Goulart, logo seriam convulsionados por episódios de violência política semelhantes aos do Brasil.

O livro traz contribuições importantes para a interpretação do personagem e para o esclarecimento de nossa história recente, e passa a integrar a escassa bibliografia dedicada a Goulart. Aguardemos novos trabalhos, que ajudem a explicar as questões ainda em aberto: qual era, afinal, o projeto político de Jango; desejaria ele uma solução autoritária, como diziam os adversários? Qual a influência efetiva exercida pela esquerda revolucionária em seu governo? Em que medida ele estava comprometido com o projeto reformista, ou seria apenas um expediente tático? Perguntas ainda sem resposta definitiva, elas encontrarão algum dia explicação satisfatória?

quinta-feira, 9 de abril de 2009

A história oficial dos evangelhos


No 1º século do cristianismo, o excesso de versões para as palavras de Jesus não era um problema. Mas, em 178 d.C., o bispo Irineu, de Lyon, resolveu unificar a Igreja. Queria fortalecer o cristianismo e controlar melhor os fiéis. Determinou, então, que apenas 4 evangelhos contavam a história verdadeira do filho de Deus e, portanto, deveriam ser os únicos seguidos pelos cristãos. O de Judas foi descartado.

Os critérios que orientaram a escolha de Irineu foram subjetivos. O primeiro, dizem historiadores, foi a facilidade de compreensão, já que os textos precisariam ser lidos em voz alta para os fiéis – afinal, a maioria era analfabeta. O segundo ponto era a idade: os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João estavam entre os mais antigos, escritos entre 65 e 95 d.C. O terceiro argumento foi o número 4, considerado especial por Irineu – porque havia "4 ventos e 4 direções (norte, sul, leste e oeste)", como escreveu o próprio bispo. E, por óbvia conclusão, 4 evangelhos. Deu para entender a lógica?

É claro, a história relatada no evangelho também foi levada em conta. Irineu representava o cristianismo ocidental, ligado aos legados do apóstolo Pedro, que pregou em Roma. Ele não aceitava – na verdade, rejeitava – os pensamentos gnósticos. "Os gnósticos diziam que a salvação vinha pelo autoconhecimento. Assim, acreditavam que não precisavam freqüentar cultos e igrejas ou ter um padre como intermediário. Também afirmavam que a morte de Cristo na cruz serviu para libertá-lo da prisão que era seu corpo, mas seu sofrimento não poderia salvar os homens que aderissem à Igreja Católica", diz Jacir de Faria. Na prática, a pregação gnóstica não era nada interessante para um bispo que tinha como objetivo fortalecer a Igreja. Evangelhos como o de Judas, Tomé e até o de Pedro receberam o carimbo de heréticos.

"Os líderes da Igreja queriam que o Novo Testamento fosse uma guia do que os fiéis deveriam aprender. Por isso, os 4 evangelhos oficiais são livros óbvios, claros. Os textos proibidos, não. Eles são místicos, inesperados, paradoxais, mais próximos à cabala judaica. São para iniciados que querem se aprofundar na fé", diz Elaine Pagels.

Ao fazer suas escolhas, Irineu selou o destino de Judas. Um exemplo: por que Pedro, que negou Cristo 3 vezes, jamais teve sua virtude colocada em dúvida e não entrou para a história como traidor? "Pedro, chefe da Igreja em Roma, tinha de ser o herói. A Igreja elegeu Judas como vilão já que um dos 12 deveria trair", diz o historiador Chevitarese.

"Judas serve como exemplo para amedrontar os cristãos que não seguirem o Evangelho", comenta Jacir. "O cristianismo precisa desses arquétipos. Destruí-los é mexer nas bases que o sustentam." Foi mais seguro para Irineu, portanto, ficar com os evangelhos de Marcos, Mateus, Lucas e João, que seguiam linhas parecidas e não feriam os princípios de que Pedro era o apóstolo mais próximo de Cristo e Judas, o traidor. (Para quem ficou curioso ao perceber que Marcos e Lucas não integravam a lista original de apóstolos, o esclarecimento: Marcos era sobrinho de Pedro. Lucas, amigo de Paulo, que se tornou apóstolo após a crucificação, segundo ele, "por vontade de Deus".)

Não chega a ser surpresa, portanto, que a Igreja tenha recebido com frieza a descoberta dos manuscritos. Ainda que pesquisadores como Marvin Meyer, coordenador dos trabalhos de tradução, defendam uma "reavaliação da figura histórica de Judas Iscariotes", o Vaticano veio a público negar a benção ao novo evangelho. Walter Brandmuller, presidente do Comitê para Ciência Histórica do Vaticano, chamou o texto de "produto de fantasia religiosa". E, na primeira missa após a divulgação do evangelho, o próprio papa Bento 16 fez questão de apresentar sua opinião sobre o tema. Não aliviou nas palavras. "O que deixa o homem imundo? A rejeição ao amor, o não querer ser amado e o não amar. É a soberba de acreditar que não precisa de purificação, a rejeição da vontade salvadora de Deus. Em Judas, vemos a natureza dessa negação com mais clareza. Ele valorizou Jesus segundo os critérios do poder e do sucesso", disse.

"A Igreja nunca vai aceitar a versão que absolve Judas da traição. Na visão dela, o pecado de Judas existiu e se deve ao mau uso de sua liberdade. Afinal, ele tinha livre-arbítrio para escolher não entregar Cristo. Não foi um ato inevitável, nem um fatalismo", diz o historiador da religião João de Araújo. O frei Jair de Faria concorda. "Judas somos todos nós quando traímos o projeto do Evangelho. O recado é claro: na dúvida, melhor não trair." Judas que o diga.

Fonte: Superinteressante, Edição 226,maio de 2006

sábado, 4 de abril de 2009

O mito por trás do mito tupinambá - Revista de História

O mito por trás do mito tupinambá

por Graziella Beting
DIVULGAÇÃO/Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo
Mussa recriou relatos indígenas/ Nativos na visão de um frade francês do século XVI/Árvore de Auaí , ilustração, frei André Thevet, 1575
O frade e cosmógrafo francês André Thevet (1502-1590) foi o capelão da expedição de Nicolas Durand de Villegagnon, que esperava fundar no Brasil a “França Antártica” no século XVI. Thevet adoeceu no início da viagem e passou só 10 semanas na baía de Guanabara, entre 1555 e 1556, o que bastou para coletar informações e publicar Les singularités de la France Antarctique (As singularidades da França Antártica).

O texto se tornou um marco da antropologia por conter mais que registros da fauna e da flora do Novo Mundo. O autor fez também apontamentos sobre mitos e costumes de índios que viviam no Rio de Janeiro. Seus relatos – que dariam corpo ao tema do “bom selvagem” na França –, se tornaram valiosos registros da cosmogonia tupinambá e foram ponto de partida do último livro do escritor Alberto Mussa.

Em Meu destino é ser onça (Ed. Record, 272 págs.), Mussa faz, como explica, um “ensaio ficcional do mito tupinambá”. Partiu de fontes históricas para recontar o mito, informando o leitor de seu percurso de pesquisa. A partir das informações recolhidas por Thevet entre os tupinambá, ele seguiu pelos escritos de Hans Staden, José de Anchieta, Manuel da Nóbrega, Fernão Cardim e outras fontes dos séculos XVI e XVII. Num primeiro momento, reescreve a mitologia indígena – ou cria, como diz, “o mito do que poderia ter sido”, ou “o mito baseado em mitos reais”.

Graziella Beting é jornalista e tradutora

Bom livro

O sol do Brasil. Nicolas-Antoine Taunay e as desventuras dos artistas franceses na corte de D. João.
Companhia das Letras, 416 páginas, R$ 55,00
Lilia K. Moritz Schwarcz

(www.companhiadasletras.com.br)

“Os trópicos difíceis de Nicolas-Antoine Taunay”, um dos capítulos mais essenciais do livro da antropóloga Lilia Schwarcz, explora o desacordo entre os princípios formais do artista e o Brasil, ou melhor, o Rio de Janeiro da corte joanina. Mas a idéia de um desajuste que marcaria esse morador da Floresta da Tijuca é fundamental na interpretação da autora: O sol do Brasil afirma a inexistência de uma missão artística francesa que se teria constituído oficialmente a convite do governo luso na América para imprimir a marca neoclássica naquele mundo primitivo e apartado da civilização. A narrativa por todos conhecida estabelece que em 1815 o marquês de Marialva, embaixador extraordinário na França, reúne artistas prestigiados e expostos a represálias devido a seu passado bonapartista. Essa versão começa a ser construída por alguns protagonistas, entre eles Jean-Baptiste Debret, e foi continuamente alimentada pela nascente historiografia brasileira, do século XIX em diante.

Para Lilia Schwarcz, trata-se de uma interpretação que considera a história a partir de um desfecho e, sobretudo, subentende a existência de um projeto. Essa anterioridade e essa premeditação é que estão em jogo, afirma, concordando, de todo modo, com a conveniência, para a corte joanina, da vinda do grupo de franceses. Por outro lado, a versão do convite e o próprio meio de designá-los como uma missão eram mais lisonjeiros para seus membros ante a iniciativa liderada por Joachim Lebreton, do Institut de France.

Essa é uma parte do livro que enfrenta a consolidada fórmula do desembarque francês em 1816; em outros capítulos, entre relatos de viagens e a fuga da Corte para o Brasil, temos as peças que antecedem a trajetória dos que vinham criar a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios. Mas uma outra série de acontecimentos, de ordem artística, informa a trajetória do pintor Taunay, como o compromisso entre a pintura neoclássica e o “elogio da nação”, o primado das paisagens e da pintura histórica.

Ao elogio segue-se o discurso da nação, tributário do sentimento da natureza, mesclado ao tema da história e que identifica o Oitocentos. Aplicar esse gênero, com seus esquemas, tons, proporções e personagens, à cena tropical torna-se o cerne de um desencontro evocado ao longo desse estudo vigoroso. Os excessos das cores e da luminosidade do céu e do sol transbordam da escala de Nicolas Taunay, são mediados pelas recorrências italianas que formam seu repertório imagético, mas o grande obstáculo, o limite mesmo está na escravidão, e por isso “a vegetação será sempre maior que os homens, os quais surgem pequenos, como detalhes perdidos. No seu lugar está o pitoresco da natureza, devidamente inflacionada de forma a reduzir o papel e o lugar da escravidão; quase uma cena calada e acessória”.

Nas legendas das reproduções que integram o livro e ao longo do texto, esse estranhamento é analisado a partir das telas do artista recortadas em seus detalhes, que são ampliados, o que, além de um recurso para o exame das obras, incide sobre a habilidade do pintor em produzir figuras miniaturizadas. Entre as 45 obras de sua fase brasileira, Taunay retratou o Rio de Janeiro em imagens mediterrânicas, árcades, com luz amarelada. Nesses e em outros quadros, os escravos aparecem como borrões indefinidos e diminutos, mas, constantes, expressam a ambigüidade de sua condição naquela sociedade e para o próprio artista. Sua presença numerosa, dirá a autora, é também sintoma de uma falta, lacuna ainda perceptível no encontro da natureza americana com a Revolução e na melancolia investida nos retratos de D. Maria Teresa e de D. Maria Isabel. Aqui, em contrariedade ao realismo do gênero, as princesas expressavam “a estranheza da monarquia momentaneamente estacionada nos alegres trópicos americanos”.

Cláudia B. Heynemann é pesquisadora do Arquivo Nacional.

Trocas seculares

O Ano da França no Brasil ainda não começou oficialmente, mas muitas cidades brasileiras já se adiantaram. Uma delas é Salvador. A Biblioteca Pública do Estado da Bahia expõe até dia 12 de abril 29 painéis contando a história das trocas culturais entre os países. “França no Brasil – Histórico da influência francesa no Brasil” faz uma viagem dos tempos da Colônia até os dias de hoje.

A biblioteca fica na rua General Labatut, 27, Barris. De segunda a sábado, das 8h30 às 21h, e domingo, das 14h às 21h. Informações pelo telefone (71) 3328-4555.