sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Iluminismo

Iluminismo é um movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nos séculos XVII e XVIII. Nessa época, o desenvolvimento intelectual, que vinha ocorrendo desde o Renascimento, deu origem a idéias de liberdade política e econômica, defendidas pela burguesia. Os filósofos e economistas que difundiam essas idéias julgavam-se propagadores da luz e do conhecimento, sendo, por isso, chamados de iluministas.

O Iluminismo trouxe consigo grandes avanços que, juntamente com a Revolução Industrial, abriram espaço para a profunda mudança política determinada pela Revolução Francesa. O precursor desse movimento foi o matemático francês René Descartes (1596-1650), considerado o pai do racionalismo. Em sua obra “Discurso do método”, ele recomenda, para se chegar à verdade, que se duvide de tudo, mesmo das coisas aparentemente verdadeiras. A partir da dúvida racional pode-se alcançar a compreensão do mundo, e mesmo de Deus.

Na gravura, Descartes cercado por estudiosos e admiradores

As principais características do Iluminismo:

•Valorização da razão, considerada o mais importante instrumento para se alcançar qualquer tipo de conhecimento;
•valorização do questionamento, da investigação e da experiência como forma de conhecimento tanto da natureza quanto da sociedade, política ou economia;
•crença nas leis naturais, normas da natureza que regem todas as transformações que ocorrem no comportamento humano, nas sociedades e na natureza;
•crença nos direitos naturais, que todos os indivíduos possuem em relação à vida, à liberdade, à posse de bens materiais;
•crítica ao absolutismo, ao mercantilismo e aos privilégios da nobreza e do clero;
•defesa da liberdade política e econômica e da igualdade de todos perante a lei;
•crítica à Igreja Católica, embora não se excluísse a crença em Deus. "

Iluminismo e a Ciência

Nos séculos XVII e XVIII, enquanto as idéias iluministas se espalhavam pela Europa, uma febre de novas descobertas e inventos tomou conta do continente. O avanço científico dessa época colocou à disposição do homem informações tão diferentes quanto a descrição da órbita dos planetas e do relevo da Lua, a descoberta da existência da pressão atmosférica e da circulação sangüínea e o conhecimento do comportamento dos espermatozóides.

A Astronomia foi um dos campos que deu margem às maiores revelações. Seguindo a trilha aberta por estudiosos da Renascença, como Copérnico, Kepler e Galileu, o inglês Isaac Newton (1642.1727) elaborou um novo modelo para explicar o universo. Auxiliado pelo desenvolvimento da Matemática, que teve em Blaise Pascal (1623.1662) um de seus maiores representantes, ele ultrapassou a simples descrição do céu, chegando a justificar a posição e a órbita de muitos corpos siderais.

Além disso, anunciou ao mundo a lei da gravitação universal, que explicava desde o movimento de planetas longínquos até a simples queda de uma fruta. Newton foi ainda responsável por avanços na área do cálculo e pela decomposição da luz, mostrando que a luz branca, na verdade, é composta por sete cores, as mesmas do arco-íris.

Tanto para o estudo dos corpos celestes como para a observação das minúsculas partes do mundo, foi necessário ampliar o campo de visão do homem. Os holandeses encarregaram-se dessa parte, descobrindo que a justaposição de várias lentes multiplicava a capacidade da visão humana.

Tal invento possibilitou a Robert Hooke (1635-1703) construir o primeiro microscópio, que ampliava até 40 vezes pequenos objetos (folhas, ferrões de abelha, patas de insetos). Esse cientista escreveu um livro sobre suas observações e criou o termo célula, hoje comum em Biologia.

As primeiras experiências com a então recém-descoberta eletricidade demonstraram que o corpo humano é um bom condutor elétrico, O menino suspenso por cordas Isolantes recebe estímulos elétricos nos pés, os quais são transmitidos à outra criança (à esquerda), a quem esta dando a mão

A Biologia progrediu também no estudo do homem, com a identificação dos vasos capilares e do trajeto da circulação sanguínea. Descobriu-se também o princípio das vacinas — a introdução do agente causador da moléstia no organismo para que este produza suas próprias defesas.

Na Química, a figura mais destacada foi Antoine Lavolsier (1743-1794), famoso pela precisão com que realizava suas experiências. Essa característica auxiliou-o a provar que, “embora a matéria possa mudar de estado numa série de reações químicas, sua quantidade não se altera, conservando-se a mesma tanto no fim como no começo de cada operação”. Atribuiu-se a ele igualmente a frase: “Na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”.
lém dos nomes citados, houve muitos outros inventores e estudiosos que permitiram, por exemplo, a descoberta da eletricidade; a invenção da primeira máquina de calcular; a formulação de uma teoria, ainda hoje aceita, para explicar a febre; a descoberta dos protozoários e das bactérias. Surgiu mesmo uma nova ciência — a Geologia —, a partir da qual se desenvolveu uma teoria que explicava a formação da Terra, refutando a versão bíblica da criação do mundo em sete dias.

Desenho esquemático do microscópio de Robert Hooke.


Tendo herdado o espírito curioso e indagador dos estudiosos renascentistas, os pesquisadores dos séculos XVII e XVIII construíram teorias e criaram inventos, em alguns casos posteriormente contestados pela evolução da ciência. Sua importância, entretanto, é inegável, tendo sido fundamental para os progressos técnicos que culminaram na Revolução Industrial. "1

Iluministas Ingleses

o século XVII, as idéias iluministas mais brilhantes surgiram na Inglaterra, país que apresentava grande desenvolvimento econômico Vejamos algumas das figuras que mais se destacaram nesse país.
Isaac Newton (1642-1727), matemático, astrônomo e físico, preocupou-se com o estudo do movimento dos corpos do universo. Demonstrou que os corpos exercem atração uns sobre os outros, formulando a lei da gravitação universal.
Os conhecimentos de Newton em Matemática e Física permitiram-lhe avançar em suas investigações astronômicas e criar, inclusive, um telescópio.

John Locke (1632-1704), ao contrário de seu contemporâneo Thomas Hobbes, que era a favor do absolutismo, escreveu o Segundo tratado sobre o governo civil, defendendo a teoria do governo limitado. Para Locke, os homens formavam a sociedade e instituíam um governo para que este lhes garantisse alguns direitos naturais, como o direito à vida, à felicidade, à propriedade, etc. Por isso, caso o governo abusasse do poder, poderia ser substituído. Outra de suas afirmações era que todos os indivíduos nascem iguais, sem valores ou idéias preconcebidas. "1


1 - FILHO, Milton B. B. História Moderna e Contemporânea. São Paulo, Scipione.1993

Iluministas Franceses

As idéias dos pensadores iluministas ingleses encontraram grande aceitação na França do século XVIII, onde atingiram seu auge. Investigando problemas políticos, religiosos e culturais, os franceses procuraram idealizar uma sociedade na qual houvesse liberdade e justiça social.

Dos franceses, Voltaire (1694-1770) foi o maior dos filósofos iluministas e um dos maiores críticos do Antigo Regime e da Igreja. Defendeu a liberdade de pensamento e de expressão.
omo forma de governo, era a favor de uma monarquia esclarecida, na qual o governante fizesse reformas influenciado pelas idéias iluministas.

Outro crítico do Antigo Regime foi Montesquieu (1698-1755), que propunha a divisão do poder em executivo, legislativo e judiciário, mantendo-se os três em equilíbrio permanente.

CEscreveu “O espírito das leis” e “Cartas persas”. Defendeu ainda a posição de que somente as pessoas de boa renda poderiam ter direitos políticos, ou seja, direito de votar e de candidatar-se a cargos públicos.

François Marie Arouet (Voltaire) um dos grandes intelectuais do Iluminismo francês.

Rousseau (17 12-1778), outro pensador francês, distinguiu-se dos demais iluministas por criticar a burguesia e a propriedade privada. Considerava os homens bons por natureza e capazes de viver em harmonia, não fosse alguns terem se apoderado da terra, dando origem à desigualdade e aos conflitos sociais. Propunha um governo no qual o povo participasse politicamente e a vontade da maioria determinasse as decisões políticas. Expôs suas idéias principalmente em duas obras: “O contrato social” e “Discurso sobre a origem da desigualdade.”

As propostas desses e de outros iluministas franceses difundiram-se pela Europa e América em boa parte graças à “Enciclopédia”. Esta volumosa obra, organizada pelos iluministas Diderot e D’Alembert e escrita por grandes pensadores e cientistas, sintetizava o conhecimento e as idéias vigentes na época.
ambém em relação à economia surgiram idéias novas, que atacavam o mercantilismo e a interferência do Estado na vida econômica. Na França apareceram os fisiocratas (fisio = natureza; cracia = poder), como Quesnay, para quem a riqueza de uma nação provém da agricultura e, portanto, da natureza. A economia seria regulada por leis naturais, sendo desnecessária a intervenção do Estado. O principio “Laissez faire, laissez passer” (Deixe fazer, deixe passar) era defendido pelos fisiocratas, onde pregavam o ideal de liberdade.

Os fisiocratas influenciaram na formação de uma corrente de pensamento chamada liberalismo econômico, da qual fazem parte os ingleses Adam Smith, Thomas Malthus e David Ricardo. "1

Capa do primeiro volume da Enciclopédia, editada em 1751

Fonte:
1 - FILHO, Milton B. B. História Moderna e Contemporânea. São Paulo, Scipione.1993
O despotismo esclarecido

" No século XVIII desenvolveu-se uma forma de governo que mesclou o absolutismo às idéias iluministas. O chamado despotismo esclarecido surgiu em países da Europa ainda essencialmente agrícolas, como Portugal, Áustria, Prússia e Rússia.

Os soberanos desse países, apoiados na burguesia e em parte da aristocracia, explicavam seu poder absoluto não pala “origem divina”, mas como resultado de necessidades sociais. Governavam em nome da razão e pretendiam construir a prosperidade de seus Estados. Diziam-se servidores da coletividades. Veja no quadro a seguir o nome dos déspotas esclarecidos e suas principais realizações.





Portugal

Marquês de Pombal - Ministro de D.Jose I (1750 - 1777)


Áustria

José II (1780 - 1790)


Prússia

Frederico II (1740 - 1780)


Rússia

Catarina, a Grande (1763 - 1796)




ESCRITOS ILUMINISTAS

Os regimes de governo e a divisão de poderes, segundo Montesquieu.

“Existem três espécies de governos: o republicano, o monárquico e o despótico (...) o governo republicano é aquele no qual o povo reunido, ou somente uma parte do povo, tem o poder soberano; a monarquia, aquela na qual um só governa, mas por meio de leis fixas e estabelecidas; enquanto que no despotismo apenas um, sem leis e sem regras, arrebata tudo sob a sua vontade e seu capricho (...).

Existe em cada Estado três tipos de poderes: o poder legislativo, o poder executivo das coisas que dependem da vontade das gentes e o poder executivo da­quilo que depende do direito civil. Pela primeira, o príncipe ou magistrado faz as leis por um certo tempo ou para sempre, e corrige ou substitui aquelas que estão feitas. Pela segunda, se faz a paz ou a guerra, se enviam ou recebem os embaixadores, se estabelece a segurança, se previnem as invasões. Pela terceira, se punem os crimes ou se julga as diferenças particulares.”

MONTESQUIEU. O Espírito das Leis

A teoria do contrato social em Diderot: o poder político emergindo do consenti­mento da nação.

“O príncipe recebe de seus súditos a autoridade que ele tem sobre eles e esta autoridade é nascida das leis da natureza e do Estado. As leis da natureza e do Estado são as condições às quais eles são submetidos (...). Uma destas condições é que não existe o poder da autoridade sobre eles a não ser pela sua escolha e consentimento e ele não pode jamais empregar esta autoridade para cassar o ato ou contrato pela qual ela lhe foi deferida: ele agirá assim contra ele mesmo, pois que sua autoridade não pode subsistir a não ser pelo título que a estabelece (...). O príncipe não pode pois dispor do seu poder e de seus súditos sem o consentimento da nação.”

DIDEROT. Enciclopédia

A Propriedade como fonte de desigualdade, segundo Rousseau

“O primeiro que cercou um terreno, advertindo: ‘Este é meu’, e encontrando gente muito simples que acreditou, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Que crimes, guerras, assassinatos, misérias e horrores teria poupado ao gênero humano aquele que (...) tivesse gritado a seus semelhantes: ‘Não escutem este impostor; vocês estarão perdidos se esquecerem que os frutos são de todos, que a terra não é de ninguém’. (...) Desde o instante em que um homem teve necessidade da ajuda de um outro, desde que ele percebeu ser conveniente para um só ter provisões para dois, a igualdade desapareceu, a propriedade se introduziu, o trabalho tornou-se necessário e as vastas florestas se transformaram em campos risonhos que passaram a ser regados com o suor dos homens e nos quais vimos então a miséria e a escravidão germinarem e crescerem com a colheita.”

ROUSSEAU, Discursos sobre a origem das desigualdades

As reformas do déspota esclarecido Frederico Guilherme I, da Prússia.

“O Estado mudou quase inteiramente de forma sob Frederico Guilherme: a Corte foi dispensada e as grandes pensões sofreram uma redução (...). Desde o reina­do de Frederico 1 houve grande quantidade de abusos relativos às taxas, que se tornaram arbitrárias. A crise de todo o Estado demandava (. . .). A fim de tornar estes impostos proporcionais, o rei fez medir exatamente todos os campos cultiváveis e restabeleceu a igualdade das contribuições segundo as diferentes categorias de boas ou más terras e, como o preço dos alimentos estava muito alto, ele aumentou também os impostos na proporção destes preços; o que aumentou consideravelmente a renda.”

Recueil des oeuvres du philosophe de Sans-Souci. In: GOTHIER, L. e TROUX, A., orgs. Les ternps ...p. 323-7.

Origem dos povos americanos


Os habitantes do continente americano descendem de populações advindas da Ásia, sendo que os vestígios mais antigos de sua presença na América, obtidos por meio de estudos arqueológicos, datam de 11 a 12,5 mil anos. Todavia, ainda não se chegou a um consenso acerca do período em que teria havido a primeira leva migratória.
Os povos indígenas que hoje vivem na América do Sul são originários de povos caçadores que aqui se instalaram, vindo da América do Norte através do istmo do Panamá, e que ocuparam virtualmente toda a extensão do continente há milhares de anos. De lá para cá, estas populações desenvolveram diferentes modos de uso e manejo dos recursos naturais e formas de organização social distintas entre si.
Não existe consenso também, entre os arqueólogos, sobre a antigüidade da ocupação humana na América do Sul. Até há alguns anos, o ponto de vista mais aceito sobre este assunto era o de que os primeiros habitantes do continente sul-americano teriam chegado há pouco mais de 11 mil anos.
No Brasil, a presença humana está documentada no período situado entre 11 e 12 mil anos atrás. Mas novas evidências têm sido encontradas na Bahia e no Piauí que comprovariam ser mais antiga esta ocupação, com o que muitos arqueólogos não concordam. Assim, há uma tendência cada vez maior de os pesquisadores reverem essas datas, já que pesquisas recentes vêm indicando datações muito mais antigas

por Funai

Vestibular

1. A produção de açúcar, desenvolvida no Nordeste brasileiro a partir do século XVI,
a) priorizou o uso de mão-de-obra indígena, graças ao domínio da técnica de cultivo;
b) promoveu a organização de uma sociedade aristocrática, patriarcal e escravista;
c) foi financiada por capitais da Coroa e da burguesia lusitana;
d) gerou uma economia monocultora e voltada para o mercado interno;
e) realizou-se em latifúndios, favorecendo o povoamento do sertão.


2. A respeito da economia e da sociedade no Brasil Colônia, é correto afirmar que:
a) no nordeste, a atividade pecuária ficou vinculada ao engenho, utilizando trabalho escravo negro e pouco contribuindo para a colonização do sertão;
b) na região das Minas, o surgimento de irmandades ou confrarias, que em geral se organizavam de acordo com linhas raciais definidas, estimulou a arte sacra barroca;
c) com o desenvolvimento da economia açucareira, as relações sociais foram adquirindo caráter aberto, favorecendo a mobilidade social de mestiços e homens brancos pobres;
d) as missões religiosas formadas pelos jesuítas visavam, através da catequese, preparar os indígenas para viverem integrados à sociedade dos brancos como mão-de-obra escrava.

3. Eram direitos dos donatários:
a) fundar vilas, conceder sesmarias e cobrar impostos;
b) a redízima, a vintena e a transferência da capitania para outro donatário;
c) fundar vilas, a redízima e a transferência da capitania para outro donatário;
d) a redízima, a cobrança de impostos e a venda da capitania para qualquer outro nobre;
e) fundar vilas, a vintena e a venda da capitania para qualquer outro nobre.

Respostas:
1. B
2. B
3. A

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Carnaval da Bahia


O Trio Elétrico

Carnal, lúdico, dilacerador, espiritualizado, físico, o Carnaval da Bahia é a maior festa urbana do Brasil, criada e mantida pelo povo. Uma manifestação espontânea, criadora, livre, pura, onde todos são—com maior ou menor competência—sambistas, frevistas, loucos dançarinos, na emoção suada atrás do som estridente, eletrizante, do trio. Ou no ritmo calmo, forte, tranqüilizante, orientalizado, do afoxé, incorporado num só movimento. Um ato de entrega, de transe e êxtase, de liberação de todas as tensões reprimidas e da envolvência absoluta entre o real e o fantástico, capaz de, num único e frenético impulso, balançar o chão da praça.

Na Bahia, são cinco dias de folia, que começa na sexta-feira, quando o Rei Momo recebe, em praça pública, as chaves simbólicas da cidade, depois de desfilar, em carro aberto, com a rainha e princesas, pelas ruas centrais da cidade. A ordem de "alegria geral" do Rei é cumprida literalmente e o delírio começa quando aparece ao longe, descendo a ladeira no sentido da praça Castro Alves, o primeiro trio elétrico. A impressão que se tem é que todas as cabeças do mundo avançam em volta do objeto luminoso e o povo se deixa possuir pelo som eletrico do dono da rua, o maior símbolo desse_Carnaval.

O trio e a praça Castro Alves são o Carnaval. A praça é o maior momento do trio, o território livre, o clímax. Se o trio pode tudo, na praça tudo é possível. A história do trio é bem anterior, apesar da praça já existir. Mas não se transavam. Foi o poeta Caetano Veloso que redimensionou o som do trio, e do próprio Carnaval, a invenção do diabo que Deus abençoou, e determinou: "A praça Castro Alves é do povo, como o céu é do avião." Caetano queria "um frevo novo" e teve mais que isso: uma praçadepúblicoheterogêneo,do gay power, artistas, intelectuais e do povo, os reais tietes do som do trio elétrico.

SENTIMENTO DA BAHIA

Mas o trio não pertence à praça, nem é exclusivo do seu público. A concretude do seu som faz o Carnaval que envolve toda a cidade: a Barra—início da orla marítima—até a Praça da Sé—no Centro Histórico de Salvador—além dos bairros que mantêm com peculiaridade própria a sua festa. Tecnicamente, o trio elétrico é somente som e luz sobre uma base física que o viabiliza (e que inclui algo tão prosaico como um caminhão). Tem quem afirme que a multidão que ele arrasta é apenas uma turba enlouquecida que se envolve de corpo e alma na dança frenética, no agitar de braços e pernas, em pulos que respondem o ritmo do trio. Mas quem já foi atrás do trio elétrico sabe que não é nada disso e entende porque ele é a síntese do Carnaval da Bahia, ou, mais ainda, porque ele diz de um sentimento da Bahia.

Foi em 1938 que surgiu a idéia do trio elétrico, quando Dodô (Adolfo Nascimento), radiotécnico e músico, e Osmar (Osmar Macedo), inventor e músico, se conheceram tocando em programada rádio, ao lado de Dorival Caymmi, entre outros nomes já famosos da época. Dodô, estudioso de eletrônica, pesquisava uma forma de amplificar o som dos instrumentos de corda, o que só conseguiu em 1948, com o aperfeiçoamento do violão maciço, que eliminava a dissonância e a distorção, principais problemas dos violões elétricos conhecidos. Em 1950, pela primeira vez, a eletricidade incorporou-se ao Carnaval baiano.

Inspirados pelo Vassourinhas—Academia de Frevo do Recife—que, de passagem para o Rio de Janeiro, se apresentou em Salvador, Dodô e Osmar resolveram sair durante o Carnaval, tocando aqueles frevos pernambucanos, com seus instrumentos e amplificadores. Assim, em cima de um fubica—um Ford 1949—equipado com dois alto-falantes, eles se apresentaram nas ruas da cidade, como a dupla elétrica. Foi um sucesso, mas havia resistências, principalmente da classe média que não gostava da "molecada" que ia atras da dupla.

Mas Dodô e Osmar não desistiram. No ano seguinte 1951, melhoraram sensivelmente a qualidade do som e, com o surgimento de um terceiro músico, Temistocles Aragão,formava-se o trio elétrico. Em 1952, um fato novo: a empresa Fratelli Vita (fabricante de refrigerantes e cristais), percebendo o sucesso e a popularidade do conjunto, resolveu patrocinar o trio, colocando-o num caminhão festivamente decorado. O êxito foi estrondoso e o trio acabaria tempos mais tarde sendo definitivamente glorificado pelo então tropicalista Caetano Veloso: "Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu."

LÁ VEM O TRIO

O trio elétrico de Dodô e Osmar fez escola. Dodô morreu e está ausente do Carnaval desde 1979, sendo substituído por Armandinho, filho de Osmar, que sempre afirma que quando morrer quer ser levado por todos os trios no "cortejo fúnebre mais alegre que já se viu". A mesma busca de perfeição acompanha o trio elétrico Tapajós, há mais de 20 anos animando o Carnaval baiano, sendo que, ao longo desse tempo, já conquistou dois tricampeonatos. O trio Tapajós surgiu em 1959, no subúrbio de Periperi,ele surgiu em 62 quando, pela primeira vez, foi ao centro da cidade. Hoje, ele é uma empresa. Mantém cinco carros sendo que apenas um permanece em Salvador e os outros vão para o sul do País.

Durante esse período surgiram outros trios: Marajós, Tupinambás, Saborosa, Ypiranga, 5 Irmãos e, já há alguns anos, vem merecendo destaque o trio elétrico do ex-conjunto musical Novos Baianos que todo Carnaval reúne os seus antigos integrantes, Pepeu Gomes, Baby, Paulinho Bocade Cantor, e sai no maior auê agitando esse Carnaval, sem tempo nem hora, com todo o espaço e muita pauleira. Todos esses trios fazem o Carnaval da cidade, circulando e puxando a multidão, que quer pular independente de qualquer integração a blocos ou outras entidades carnavalescas.

Foram criados, também, os trios détricos (e mini-trios) que saem ligados a blocos e cordões. $ão verdadeiros palcos instalados sobre grandes caminhões, com excelente capacidade de sonorização, luz, cor e efeitos especiais. Destacam-se os dos blocos Eva, Trás os Montes, Cheiro de Amor Camaleão, Pinel, com suas bandas possantes, que enlouquecem não apenas os integrantes do bloco mas os foliões de uma maneira geral, que são obrigados a se contentar em pular fora do espaço fisico ocupado pelo bloco, geralmente garantido através de uma corda de isolamento mantida por seguranças especiais.

MANDA DESCER...

"Omolu, Ogum, Oxum, Oxumaré, Todo o pessoal, Manda descerpra ver, "filhos de Ghandi". (Gilberto Gil). Nada é comparável a quem vem de um trio elétrico, suor escorrendo pelo corpo, a carne exposta, o corpo aberto e bate de frente com um afoxé, naquela atitude pastoral, fechada, enchendo a rua com a sua força. "Dá vontade de chorar, você sente aquela calma, aquele arrepio percorrendo o corpo, aquela força tomando conta de você. Esse é o lado espiritual, orientalizado do Carnaval, o equilíbrio", como afirma o cantor e compositor Gilberto, o mais célebre integrante do afoxé Filhos de Ghandi.

O afoxé, explica o professor e historiador Cid Teixeira, é um bloco carnavalesco, uma brincadeira de forma, conteúdo e comportamento específico tendo em vista que os seus membros foliões estão vinculados a um terreiro de candomblé, unidos por uma religião, pelo uso de uma língua, dança, ritmos e códigos de origem nagô. Além disso, tem, fundamentalmente, consciência de grupo, comunidade de valores e hábitos que o distingue de qualquer outro tipo de bloco ou cordão. Os laços lúdicos religiosos que congregam as pessoas no afoxé importam, antes de mais nada, pela manutenção de valores culturais ligados ao afoxé e suas tradições africanas, transportadas para a Bahia, adaptadas e assimiladas dentro de uma nova realidade.

Atualmente, entre todos, Filhos de Gandhi é o mais famoso. Com sua roupa branca, seu turbante felpudo, na sua maioria é composto por negros, homens de origem humilde, operários, ligados aos inúmeros terreiros de candomblé da Bahia. Mas o primeiro grupo de afoxé saiu às ruas em 1895 e mostrava aos foliões de Salvador as pectos dos ritos do candomblé. A partir dessa época surgiram muitos outros vindos dos bairros de Brot,as, Engenho Velho, Soledade, Santana e Aguade Meninos, destacando-sea Chegada Africana e os Filhos da Africa como os mais representativos. O Clube de Pândegos da África, surgido em 1897, fez também muito sucesso.

FORÇA E NEGRITUDE

Mas o Carnaval da Bahia é ainda rico pela força de outras manifestações culturais, como são os blocos afro, cadaano em quantidade maior e alguns, já conhecidos nacionalmente, como é o caso do llê Aiyê. Outros estão crescendo e criando fama, a exemplo do Malê Debalê, do Araketu, ObáLaiyê e Puxada Carnavalesca Axé. A força desses blocos está na cultura negra, na beleza e plasticidade de suas sambistas, na própria fantasia e na alegria dos se,us temas, sempre homenageando a "mãe Africa", e na harmonia de suas baterias, puxadas, geralmente, por ágeis mãos negras, no som sincopado dos atabaques. Culturalmente, eles representam a força viva da negritude na Bahia e o Carnaval é a forma mais pungente de fazer ecoar o seu grito de liberdade.

Outros blocos e cordões fazem do Carnaval uma festa que Ihes permite mostrar a sua força e união. Nesse caso, destaca-se o Apaches do Tororó, com mais de mil homens empunhando machados e cânticos de amor contra a guerra, na categoria de blocos índios. Existem outros: Cacique do Garcia, Comanches, Guaranys e Tupys. Todos representam segmentos de uma camada mais baixa da população e, por isso mesmo, são de uma alegria contagiante, de um samba forte, autêntico, com suas negras e mulatas sambando no pé, de tangas, missangas e colares.

Esfuziantes e descompromissados—a não ser com o direito de brincar—estão os outros cordões e blocos formados por jovens da classe média. Existem os que sempre se apresentam com fantasias sofisticadas (Os Internacionais, Corujas, Lord's) e os que preferem a simplicidade e o comodismo de mortalhas ou macacões (Trás os Montes, Cheiro de Amor, Eva, Camaleão, Jacu, Filhos do Barão). Há ainda os que, ferindo os padrões normais, desfilam tra vestidos de mulheres, homenageando algumas minorias, as prostitutas e os travestis e dando ao Carnaval a irreverência e humor indispensáveis.

CONQUISTA DO POVO

Importado através do Entrudo, uma festa portuguesa de uma violência inconseqüente, acapadoçada, sem ritmo e sem riso, diz a história, o Carnaval da Bahia criou a sua própria maneira de ser, bem diferente das origens herdadas. Verdade que nas últimas décadas do século passado não era assim. Era um Carnaval elitista, feito para a classe média, com desfile das Sociedades Carnavalescas Fantoches da Euterpe e Cruz Vermelha (Cruzeiro da Vitória), as principais, seguidas do Inocentes em Progresso e Democrata. Copiando o que acontecia na Europa, essas entidades saíam pelas ruas centrais de Salvador, com carros alegóricos, rainhas e princesas, além das alas dos cavaleiros, uniformizados como soldados e oficiais romanos, destacando-se o arauto.

Na década de 40, o povo não participava desse tipo de Carnaval-espetáculo. No máximo, surgiam de vez em quando em áreas da avenida Sete de Setembro, São Pedro, Piedade e Mercês, jamais chegando ao Campo Grande locais nobres da cidade) as batucadas, os bandos de índios, os tímidos afoxés (grupos de homens com seu ritmo lento, com suas máscaras de traços africanos, alguns recobertos de palhas de coqueiros, usando apenas instrumentos de percussão, os pés calosos, agora no asfalto). O povo se divertia em áreas delimitadas: Baixa dos Sapateiros (onde se concentra o Comércio mais popular de Salvador) e Terreiro de Jesus (que integra o Centro Histórico da cidade). Aos poucos, porém, as camadas populares foram ocupando espaços na Sé, Praça Municipal, rua Chile, alcançando a praça Castro Alves, locais onde a festa acontece com toda a força por ser o Centro de Salvador, fazendo o verdadeiro Carnaval da Bahia que acontece hoje.

A pagã Carnen Lévare (abstinência da came, data que designava a véspera de Quarta-feira de Cinzas), herança dos bacanais, lupercais e saturnais romanos, aqui se realiza através da espontaneidade popular, orientada pelos organismos governamentais que atuam respeitando a vontade do povo. O Carnaval da Bahia, na verdade, começa quando o sol de amarelo Oxum brilha no céu, anunciando a festa do verão baiano, com muito samba, festa de largo, a partir do dia maior, Santa Bárbara, Iansã, no sincretismo religioso, senhora das nuvens de chumbo, deusa dos relâmpagos, rainha dos raios e das tempestades, que segura o tempo até o Carnaval chegar.

Fonte: Bahiatursa

Livro do mês

O Grande Irmão - Da operação Brother Sam aos anos de chumbo. O governo dos Estados Unidos e a ditadura militar brasileira - Carlos Fico



(www.record.com.br)

“Quando a maior parte dos parlamentares abarrotou o escritório do terceiro andar, o presidente Ranieri Mazzilli acabava de ser empossado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Ribeiro da Costa. Eram 3h30 da manhã de 2 de abril. O arremate final havia sido dado ao golpe de estado”. Assim Robert Bentley, funcionário da embaixada americana em Brasília e testemunha ocular dos eventos, narra de dentro do palácio presidencial o dramático desfecho do governo Goulart e o começo da ditadura.

O relato está em uma das quarenta e três caixas de documentos do Departamento de Estado dos EUA que, junto com outro material inédito de vários setores da administração americana, constituem a fonte que Carlos Fico examinou, com rigor e paixão de pesquisador, para oferecer um quadro vivo da participação do Grande Irmão na derrubada de Jango e na instauração do regime militar no Brasil. Embora já conhecida, essa participação é esquadrinhada aqui com a ajuda da interessante documentação e estudada em sua evolução. Da Operação Brother Sam, cujo esquema é preparado desde 1963 e montado com a conivência de militares brasileiros, até os anos do AI-5 e da tortura, quando o apoio americano se torna mais discreto e pragmático.

A narrativa, que vai de 1963 a 1973, acompanha o Brasil de Castelo Branco, Costa e Silva e Médici na sua parceria com os EUA de Kennedy, Johnson e Nixon. As inevitáveis limitações da obra, assinaladas pelo próprio autor na apresentação, poderão estimular a pesquisa brasileira sobre o tema, pois, como ele mesmo lembra, “além de brazilianists, precisamos de americanistas”.

(Marcello Scarrone)

Fonte: biblioteca Nacional

“É cada vez mais difícil vender a alma ao Diabo, por excesso de oferta.”
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), poeta.

3 de maio


Na capa de O Malho de 1º de maio de 1920, o gênio brasileiro da caricatura, J. Carlos, brinca com as comemorações do Descobrimento (naquela época, comemorava-se a data no dia 3 de maio). De Cabral aos nossos “papagaios” congressistas, uma crítica rimada de algumas mazelas nacionais:

“A nau descobre / A mensagem encobre / O Congresso e o cobre”.
Título da charge: 3 de Maio

Fonte: Revista da Biblioteca Nacional